Quase 3 mil trabalhos aprovados no 12º CBA estão sendo apresentados nos 330 Tapiris de Saberes, que acontecem ao longo das manhãs dos dias 21, 22 e 23 de novembro no prédio da ACM (Associação Cristã de Moços); veja detalhes sobre os eixos temáticos deste 12º CBA
Concentrados nas três manhãs do 12º Congresso Brasileiro de Agroecologia, os Tapiris de Saberes são espaços de partilha dos trabalhos científicos, dos relatos técnicos e dos relatos populares em texto e em vídeo.
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“Tapiri” é uma palavra indígena no tronco tupi presente no vocabulário de populações ribeirinhas e diversos povos tradicionais na região Norte do Brasil, e representa a palhoça, o lugar onde as pessoas se reúnem para dialogar, comer, descansar e trocar experiências.
Esse é o nome dado ao espaço de apresentação dos trabalhos nos CBAs, desde 2015. Os Tapiris acontecem no prédio da Associação Cristã de Moços (ACM), localizado na Rua da Lapa, 86. Veja mais detalhes sobre os eixos:
8º andar – Políticas Públicas e Agroecologia
O Grupo de Trabalho (GT) sobre o eixo temático Políticas Públicas e Agroecologia terá a apresentação de 150 trabalhos. De acordo com Guilherme Strauch, engenheiro agrônomo da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Rio de Janeiro (Emater-Rio), um dos coordenadores do grupo de trabalho, o eixo reuniu uma grande diversidade de temas e abordagens – locais, territoriais, regionais, ou por diferentes grupos de agricultoras/es. Os principais temas tratados foram:
- acesso às políticas públicas de mercado institucional, incluindo as experiências locais/territoriais e os entraves para esse acesso;
- experiências institucionais com protocolos de transição agroecológica e aqueles experimentados por organizações de agricultoras/es;
- redes e arranjos institucionais de extensão e políticas públicas;
- emprego de metodologia para análise de políticas públicas;
- experiências com políticas públicas municipais de produção de base agroecológica e distribuição de alimentos.
8º andar – Campesinato e Soberania Alimentar
As experiências de resistência e de organização de mulheres deram a tônica dos trabalhos da temática Campesinato e Soberania Alimentar.
O papel ativo das mulheres aparece em produções de várias regiões do país que abordam a ação sociopolítica da diversidade de sujeitos: povos indígenas, comunidades quilombolas, assentadas/os da reforma agrária, agricultoras/es familiares e camponesas/es.
As lutas, a produção de conhecimentos, a formação, a incidência sobre as políticas públicas e as formas de organização coletiva destes povos são algumas das temáticas presentes nos trabalhos.
Ao lado da questão feminista e de gênero, a relação entre agroecologia e soberania e segurança alimentar e nutricional foi abordada em vários trabalhos que, sob diferentes ângulos, jogam luz sobre o tema do abastecimento alimentar.
Os destaques vão para produções sobre circuitos curtos de mercado, como as feiras; o acesso aos programas de compras públicas, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), as CSAs (comunidades que sustentam a agricultura); e as ações de distribuição de alimentos em tempos de crise, como durante a pandemia de covid-19.
“São trabalhos que abordam a importância das políticas públicas, de caminhos para o consumo sustentável e das ações de solidariedade e cidadania ativa na relação campo-cidade, entre outros aspectos”, explica Maria Emília Pacheco, assessora nacional da FASE e avaliadora dos trabalhos submetidos dentro do eixo temático.
A parecerista destaca também a questão fundiária na produção de alimentos agroecológicos, com trabalhos que dialogam com a agrobiodiversidade dos quintais e das florestas, com o manejo das sementes e com a afirmação da sociobiodiversidade brasileira. Ainda dentro desse recorte, a resistência camponesa na luta pela terra e pela água também marcou presença entre algumas produções, com uma delas resgatando a história da repressão ao campesinato.
“O alcance do tema ultrapassou as fronteiras do nosso país, trazendo ainda um trabalho do Paraguai”, ressalta Maria Emília.
8º andar – Biodiversidade e Conhecimentos das/os Agricultoras/es, Povos e Comunidades Tradicionais
As sementes brotaram com força como temática do eixo Biodiversidade e Conhecimentos das/os Agricultoras/es, Povos e Comunidades Tradicionais. Os trabalhos sobre sementes discutem questões como o uso e a conservação de variedades crioulas, a importância das guardiãs e guardiões, a valorização de casas e bancos de variedades locais e/ou crioulas e o melhoramento genético participativo.
“Esta é uma área que tenho estudado e durante as avaliações dos trabalhos me deparei com vários muito interessantes. Há ótimos trabalhos com bancos comunitários de sementes e com a conservação de sementes utilizando estratégias inovadoras e pautadas na biodiversidade”, ressalta Ana Cristina Siewert Garofolo, pesquisadora da Embrapa Agrobiologia que fez parte da comissão de pareceristas.
Outro tema de destaque citado pelos pareceristas foi o de plantas alimentícias não convencionais, as “PANCs”, com trabalhos que abordam grupos de espécies ou algumas de maior apelo.
“No entanto, observa-se de forma geral que todos os temas apresentaram uma abordagem transversal, associados frequentemente às temáticas de comunidades tradicionais, questões de gênero, quintais produtivos e sistemas agrícolas tradicionais, além de muitas abordagens que conduziram para a discussão de soberania e segurança alimentar e nutricional e estratégias voltadas ao bem viver”, afirma Amaury da Silva dos Santos, pesquisador da Embrapa Alimentos e Territórios que também apoiou a seleção dos trabalhos.
Entre os 246 trabalhos aprovados dentro do eixo, houve 9 vídeos, 13 relatos de experiência popular, 73 relatos de experiência técnica e 151 resumos expandidos.
9º andar – Infâncias e Agroecologia
Neste eixo temático, que se quer interdisciplinar, transversal e de “raízes crianceiras”, cujo lema é “Agroecologia começa nas infâncias”, são compartilhados estudos, pesquisas e experiências agroecológicas construídas na escuta e na parceria com as crianças, suas sabedorias, seus protagonismos e seus brincares.
Maria do Carmo Couto Teixeira, do Departamento de Educação da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e uma das coordenadoras do GT, conta que foram inscritos e avaliados 43 trabalhos e o que mais chamou a atenção da equipe foram os trabalhos em co-autoria com as crianças.
Um dos trabalhos, intitulado “O Rio Piracicaba aos 11 anos: aprendendo hidrologia e agroecologia através da observação e dos sentidos”, é um relato de experiência técnica escrito por Harum Peruchi de Almeida, menino de 11 anos, filho de uma engenheira florestal, que explica o objetivo da experiência relatada: “a intenção é ver como o Rio [Piracicaba] vai mudando com o decorrer dos meses. Tem vez que está mais baixo, mais limpo. Quando chove, fica mais sujo, pois as gotas d’água batem no solo e caem no rio, porque esse solo é de cana-de-açúcar, então é muito judiado. Mas, quando a chuva cai em solo de agrofloresta, a água fica no solo”. A experiência de Harum foi tema de reportagem publicada no G1.
Já Vivian Catenacci, da coordenação do eixo temático, destaca o trabalho “Ciranda Infantil: um espaço de acolhimento e de educação agroecológica”, que apresentou a experiência da Ciranda Infantil do III Seminário Nacional de Educação em Agroecologia (SNEA), sob a perspectiva de quem coordenou este espaço (representante do GT Infâncias da Associação Brasileira de Agroecologia), de duas cirandeiras (uma servidora do Instituto Federal do Pará (IFPA) e uma estudante de pós-graduação do Instituto) e de uma das crianças que esteve presente nos três dias de evento.
Ela conta que a menina Fabiane, de 10 anos, acompanhou todas as atividades da Ciranda e se empolgou com a possibilidade de compartilhar essa experiência através da coautoria de um relato escrito para o 12º CBA. Fabi, que vive em Castanhal (PA), está no Congresso para também contribuir com a apresentação do trabalho em um dos Tapiris de Saberes do Eixo Infâncias e Agroecologia.
9º andar – Juventudes e Agroecologia
O Eixo Juventudes e Agroecologia apresenta 34 trabalhos, oriundos de diversas regiões do Brasil. Desse total, 32 trabalhos no formato de escrita, dos quais 16 Resumos Expandidos, 10 Relatos de Experiência Técnica e 6 Relatos de Experiência Popular, além de dois relatos no formato de vídeo.
São múltiplas as experiências trazidas pelas juventudes nos trabalhos submetidos ao 12º CBA, mas podemos destacar quatro grandes temáticas principais abordadas e protagonizadas por essas e esses jovens em seus trabalhos: Educação e construção do conhecimento agroecológico pelas juventudes; Produção – experiências produtivas das juventudes; Permanência das e dos jovens no campo; e Juventudes e agroecologia no espaço urbano.
“Além disso, observamos uma ampla gama de trabalhos que destacam o protagonismo jovem feminino, onde o recorte de gênero também se sobressai”, informa Maiz Bortolomiol Dias, agrônoma, mestranda em Desenvolvimento Rural na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e integrante da coordenação do eixo.
9º andar – Ancestralidade, Terra e Território
Alimentação tradicional, racismo ambiental, educação e feminismos foram alguns dos temas prevalentes entre os 300 trabalhos do eixo Ancestralidade, Terra e Território a serem apresentados no Congresso Brasileiro de Agroecologia.
O destaque foi para produções vindas das regiões Nordeste e Centro-Oeste do Brasil, que tratam de forma direta das questões ligadas ao racismo ambiental e à luta das mulheres por território.
As mulheres indígenas e pretas marcam forte presença. Além da participação expressiva de indígenas como autoras, algumas produções de maior destaque trazem experiências de protagonismo agroecológico de mulheres pretas.
É o caso dos trabalhos “Teia das pretas: a comunicação antirracista que costura vínculos entre mulheres e territórios agroecológicos da Zona Oeste do Rio” e “O tear da vida: a escrita como caminho de cura e libertação”. Ambos abordam a força organizativa das mulheres e seu poder em transformar as realidades em seus entornos.
“Nos chamou atenção a relação segura e engajada das mulheres, abordada nestes e em outros trabalhos e, no entanto, o pouco reconhecimento disso na construção da Agroecologia”, afirma Domênica Rodrigues, da coordenação colegiada do eixo.
9º andar – Agriculturas Urbanas
Presente nas duas edições anteriores do CBA, o eixo Agriculturas Urbanas traz, nesta edição do Congresso, um foco especial nas ciências e modos de vida dos povos de matriz africana, indígena e camponesa, bem como nas formas de organização protagonizadas por mulheres e juventudes.
Os trabalhos com esse enfoque revelam vias para repensar e se apropriar dos espaços urbanos cotidianos enquanto espaços possíveis de reprodução da vida, de luta pelas diferenças, de exercício de autonomias, promoção de saúde e bem viver.
O eixo também busca promover um olhar crítico sobre iniciativas e concepções de agricultura urbana que não questionam o modelo capitalista de desenvolvimento. Essas abordagens buscam dar resposta aos problemas sociais e ambientais presentes nos contextos urbanos, com base em soluções tecnológicas pontuais ou na promoção de uma “economia verde”.
A coordenação do eixo celebra o recebimento de 129 trabalhos que serão debatidos nos Tapiris de Saberes, em 5 salas, durante os 3 dias de apresentação. Foram recebidos 15 Relatos de Experiência Popular, 41 Relatos de Experiência Técnica, 52 Resumos Expandidos, além de 21 vídeos.
A maioria dos trabalhos são relatos de experiência sobre hortas, quintais produtivos e sistemas agroflorestais (SAFs) nas mais variadas formas de gestão e ocupação de espaços urbanos.
Outros trabalhos abordaram experiências de feiras e comercialização, as relações de gênero, a relação com a saúde, com o cultivo de plantas medicinais, com o uso do espaço de cultivo como ambiente terapêutico, com a alimentação, com o resgate cultural de receitas e técnicas de manejo, assim como ações que unem saberes tradicionais e um cuidado solidário.
Destacam-se ainda trabalhos que evidenciam a produção de conhecimentos sobre as agriculturas urbanas brasileiras e a construção de políticas públicas sobre a temática.
Uma dimensão recorrente em diversas experiências foi a mudança concreta que a prática cotidiana da agricultura urbana trouxe para a vida das pessoas e para os espaços, que antes estavam servindo de acúmulo de lixo, entulhos, foco de doenças e que passaram a produzir alimento sem veneno e a ser um local de encontro e socialização das famílias e pessoas do entorno.
9º andar – Arte, Cultura, Comunicação Popular e Agroecologia
No eixo Arte, Cultura, Comunicação Popular e Agroecologia, a diversidade de territórios, vozes e expressões ganhou destaque. A temática contará com a apresentação de 73 trabalhos de todas as regiões do Brasil e com os mais variados perfis de participantes, entre elas/es artistas, comunicadoras/es, agricultoras/es, estudantes e professoras/es que buscam sensibilizar e difundir os conhecimentos da agroecologia através da arte e da comunicação.
As produções chegaram nos diversos formatos adequados ao Congresso. São trabalhos que provocam, durante os três dias de Tapiris de Saberes, discussões sobre temas pulsantes, tais como o processo criativo de comunicar as experiências agroecológicas, as trajetórias de comunicação inclusiva e popular e um olhar crítico sobre a agroecologia na mídia hegemônica.
“Na área da comunicação, teremos também a discussão sobre novas ferramentas para disseminar conhecimentos da agroecologia, como os podcasts”, afirma Debora Santiago, do comitê de pareceristas.
Outro recorte que marcará forte presença nas manhãs de tapiris do eixo será o das práticas culturais que contribuem para colocar a agroecologia “na boca do povo”, entre elas literatura, poesia, artes visuais, dança, teatro, festas da colheita e outras.
10º andar – Manejo de Agroecossistemas
Dos quase 3 mil trabalhos apresentados no CBA, 595 fazem parte do eixo Manejo de Agroecossistemas. Diante do recente retrocesso em relação aos agrotóxicos, transgênicos e tantos outros entraves à transição agroecológica, o GT Manejo de Agroecossistemas pretende dar visibilidade às experiências concretas que estão acontecendo nos territórios, a fim de mostrar caminhos e alternativas de agroecossistemas em constante diálogo com a sociedade e visando a construção do conhecimento.
Os trabalhos foram agrupados nos seguintes sub-eixos: Criação Animal, Indicadores e Metodologias Participativas, Manejo de Agroecossistemas, Plantas Alimentícias Não Convencionais, Sistemas Agroflorestais, Sanidade Vegetal, Solos e Nutrição, e Técnicas e Tecnologias Sociais.
De acordo com Eduardo Ferreira Sales, um dos integrantes do GT, o objetivo do eixo temático é avançar, também, na construção de estratégias sociais e ecologicamente contextualizadas que dialoguem com os seguintes temas: bioinsumos; manejo agroecológico de insetos, patógenos e plantas espontâneas; recursos florais para polinizadores; abelhas nativas; solo e água; sistemas agroflorestais; sistemas agroecológicos de criação animal (incluindo aquicultura e pesca); sistemas de produção orgânica e agroecológica; sistemas de produção de plantas alimentícias não convencionais (PANCs) ou matos de comer; beneficiamento e processamento de produtos agroecológicos; processos de restauração ecológica; redesenhos de paisagens; policultivos; transição agroecológica; monitoramento e avaliação de sistemas produtivos na perspectiva agroecológica; técnicas e tecnologias sociais compatíveis com os princípios da agroecologia, como bioconstruções, saneamento rural, equipamentos e ferramentas para o manejo dos agroecossistemas, energia alternativa.
12º andar – Sistemas Agroalimentares e Economia Solidária
“Sistemas Agroalimentares e Economia Solidária” é composto por 224 trabalhos e busca contribuir com reflexões acerca dos processos de organização coletiva da produção, distribuição e consumo solidários de alimentos, originários da vasta multiplicidade de realidades da agricultura familiar de base agroecológica e dos povos e comunidades tradicionais.
O eixo tem como destaques as seguintes temáticas: sistemas agroalimentares localizados, sustentáveis e comunitários; relocalização e justiça alimentar; construção social de mercados; circuitos curtos de comercialização e suas múltiplas experiências (feiras, mercados institucionais, cooperativas, associações, redes e comunidades que sustentam a agricultura); processos participativos de garantia da qualidade orgânica e agroecológica da produção, como os Organismos de Controle Social/OCS, os Sistemas Participativos de Garantia (SPG) etc; políticas públicas de fomento às economias centradas no Bem Viver, mercados territoriais, segurança alimentar e nutricional e espaços de participação social e controle social; redes solidárias de produção e consumo crítico, político, solidário e ou consciente; formas de organização da economia solidária e desenvolvimento social, local e sustentável; organizações coletivas econômicas de mulheres e jovens do campo; mercados institucionais e estratégias de acesso; agroindústrias familiares, adequação sanitária, rotulagem e legislação; outras economias em interface com a agroecologia. Estimula-se que os trabalhos do eixo promovam análises que levem em consideração relações de gênero e diversidade sexual, raça, classe e geração, como lentes fundamentais na construção da economia solidária e agroecologia.
Isabela Fredes Freitas, mestre em Agroecologia pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), uma das coordenadoras do eixo, explica que, entre as abordagens recorrentes, os temas mais trabalhados foram feiras livres, agroecológicas, da agricultura familiar e de economia solidária; circuitos curtos de comercialização; grupos, redes e células de consumo responsável/consciente; associações e cooperativas da agricultura familiar; organização coletiva e protagonismo de mulheres e jovens nos espaços de comercialização; certificação participativa e mecanismos da conformidade e qualidade orgânica e agroecológica; e estratégias de diminuição da fome a partir de experiências solidárias.
Textos: Fernanda Favaro e Paula Guatimosim